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Chico Alencar

A dor inconsolável das famílias que perderam suas crianças na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, desperta consternada solidariedade. Ver adolescentes executados no espaço sagrado e aparentemente seguro da sala de aula é mais absurdo ainda e nos impõe profunda reflexão.
É certo que este massacre não se insere no painel tristemente costumeiro da criminalidade, mas no da violência social insana. Os gatilhos exterminadores também foram apertados, de forma invisível, por todos os que temos responsabilidade pública, já que qualquer ato de repercussão coletiva tem propulsores sociais. Todo “ponto fora da curva” reflete, em seu traço, algo da própria curva.
O assassino da escola provocou tamanha letalidade porque é frouxo o controle da circulação de armas e munição em nosso país. O armamentismo ilegal, crescente, é favorecido também pela noção importada do “cada indivíduo uma arma”. Urge restabelecer o monopólio exclusivo da força para os agentes públicos do Estado de Direito Democrático, que o referendo de 2005 negou.
O criminoso imbuiu-se da “missão de terror” alimentado por meios massivos de “entretenimento” que disseminam serial killers, videogames e filmes propagadores da violência, da eliminação dos adversários, do sexismo machista, do espetáculo da destruição.
O transtornado, no seu isolamento, distante de política pública de saúde mental articulada com instituições de ensino, cristalizou comportamento mórbido talvez também estimulado por fanatismos maniqueístas, que segmentam o mundo em “puros e impuros”.
O matador encontrou mais facilidades no seu trajeto de morte porque nossas precarizadas escolas públicas já não têm quantitativo de servidores que possa contribuir para maior segurança do cotidiano pedagógico. Situações atípicas são quase sempre inevitáveis, mas seus efeitos devastadores podem ser mitigados. Maior efetividade da ronda escolar contribuiria para isso, sem transformar nenhuma escola – espaço comunitário de troca e alegria – em bunker.
O homicida foi produzido também por nossa indiferença. Quem sabe até por nossa adesão ao mundo da competição desvairada, da anulação do diferente, da naturalização das agressões e do bullying opressor. Ambiente civilizatório perverso que muito(a)s educadore(a)s e cidadãos comuns – tantas vezes vítimas dele – lutam por transformar, para que exista possibilidade de futuro.
O poeta que dá nome à escola enlutada afirma que “nós temos uma visão clara desta hora: sabemos que é de tumulto e incerteza”. E proclama o “anúncio do que virá, uma reiniciação na esperança, uma promessa de esplendor” (Tasso da Silveira, “Intróito”, 1932). Apesar da aguda dor, esperancemo-nos, teimosa e operosamente.
*Chico Alencar é deputado federal (PSOL/RJ) e escreveu para ‘O Globo’, em 14 de abril de 2011.
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