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O Brasil é considerado um exemplo mundial de combate ao trabalho
análogo à escravidão. Por que não fazer pressão para exterminá-lo em
nível mundial?
Na semana passada, comentamos o lançamento da
agenda de compromissos e dos princípios e critérios para a
sustentabilidade do carvão vegetal de uso siderúrgico no país. O
objetivo é conseguir que até 2020 todo o carvão vegetal produzido no
país venha de floresta plantada ou manejada e livre de trabalho forçado.
Hoje
o Brasil é considerado um exemplo mundial de combate a essa chaga,
tanto pela atuação das empresas quanto dos governos. A própria sociedade
brasileira está cada vez mais consciente e mobilizada contra essa
prática.
No âmbito das empresas, além dos compromissos
voluntários, surge agora uma ferramenta que pode contribuir para
prevenir o risco de envolvimento com trabalho forçado. Trata-se do
primeiro Atlas do Trabalho Escravo no Brasil, lançado pela ONG Amigos da Terra Amazônia Brasileira.
Com toda essa experiência acumulada, por que o Brasil não faz pressão para um combate ao trabalho escravo em nível mundial?
O que é o Atlas
Realizado
pelos geógrafos da USP Hervé Théry, Neli Aparecida de Mello, Júlio Hato
e Eduardo Paulon Girardi, com apoio da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), o Atlas do Trabalho Escravo no Brasil foi
desenvolvido com uma metodologia inédita que caracteriza a distribuição,
os fluxos, as modalidades e os usos do trabalho escravo no país, nas
escalas municipal, estadual e regional, utilizando fontes oficiais e
consolidadas.
A publicação também traz dois índices: o Índice de
Probabilidade do Trabalho Escravo e o Índice de Vulnerabilidade ao
Aliciamento. O primeiro traz levantamentos em nível municipal. Por isso,
pode constituir-se numa ferramenta de planejamento bastante útil para
financiadores, gestores públicos e administradores do setor privado,
dando mais precisão às análises de risco e às decisões. O Índice de
Vulnerabilidade ao Aliciamento aponta as regiões de origem do trabalho
escravo, sendo, portanto, importante para gestores de políticas públicas
e ações sociais.
A metodologia aplicada para elaborar o Atlas
também permitiu construir o perfil típico do escravo brasileiro do
Século 21: ele é migrante do Maranhão, do norte do Tocantins ou do
Piauí, do sexo masculino, analfabeto funcional e foi levado para as
fronteiras móveis da Amazônia, em municípios de criação recente, onde é
utilizado principalmente em atividades vinculadas ao desmatamento.
Esse Atlas
é útil também para a sociedade civil manter-se informada e atenta.
Afinal, casos recentes mostram que o trabalho forçado não ocorre apenas
em afastadas regiões rurais brasileiras, mas também nas grandes cidades.
Esse
avanço no combate, todavia, precisa ganhar escala internacional, porque
o trabalho análogo à escravidão ocorre em todo o mundo e pode “voltar”
ao país agregado às importações.
E o resto do mundo?
No
lançamento da agenda de compromissos, um diretor de empresa que tomou a
palavra ressaltou exatamente esse aspecto do problema. Ele voltava de
uma recente viagem à China, onde visitou diversas empresas de autopeças e
constatou tanto trabalho forçado quanto trabalho indecente. Por isso,
ele sugeriu que as empresas e o governo brasileiros fizessem um esforço
internacional maior pelo combate diuturno ao trabalho forçado.
Se
esse esforço não for feito, o país continuará tendo trabalho escravo via
importações. Corremos o risco de ter o carvão siderúrgico sustentável,
mas, continuarmos insustentáveis porque a autopeça importada (e
produzida com ferro-gusa e aço brasileiros) é contaminada pelas
condições indecentes de trabalho e pela degradação ambiental.
Vem
aí um fórum em que esse problema deve ser discutido em profundidade: a
Rio+20. Uma das propostas das empresas brasileiras ao “rascunho zero”
dessa conferência é que as companhias que operam em vários países adotem
um mesmo padrão internacional de operação, de respeito às convenções da
ONU sobre direitos humanos, trabalho e meio ambiente, e adote esses
padrões independentemente da legislação de cada país. Com isso, o
combate ao trabalho forçado entra na estratégia internacional da
corporação, sendo, dessa forma, mais eficiente.
Outra medida que
pode ser discutida e aprovada na Rio+20 é a constituição de uma
governança internacional coordenada que promova compromissos voluntários
entre as empresas, monitore e contribua para que os governos combatam
essa prática e ajude a diminuir o problema num período estabelecido de
acordo com as partes.
Hoje, o trabalho forçado se espalha por
todos os continentes. Segundo informações da OIT, a Ásia e o Pacífico
ocupam o primeiro lugar no ranking da distribuição regional do trabalho forçado. São 9,49 milhões de pessoas submetidas a essa condição.
Em
segundo lugar, aparecem a América Latina e o Caribe, com 1,32 milhões
de vítimas. O terceiro lugar é ocupado pela África subsaariana, com 660
mil trabalhadores forçados. Já os países industrializados aparecem na
quarta colocação, com cerca de 360 mil trabalhadores escravos. O Oriente
Médio e o Norte da África aparecem na quinta posição, com 260 mil
vítimas.
O problema é mundial e exige governança mundial. E, sem
condições dignas de trabalho para todos, não há equilíbrio ambiental,
como sempre ressalta Achim Steiner, diretor-executivo do Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).

CEPRO – Um Projeto de
Cidadania, Educação e Cultura em Rio das Ostras.
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